31 julho, 2007

Crescei e multiplicai-vos todos?

Não percebo esta obsessão com a Natalidade. Pois se ainda há uns anos se apontava o excesso de população como um dos maiores problemas a enfrentar neste inicio de século...

A não ser que a população em excesso só seja um problema quando não tem a mesma cor que nós.

Mas tirando do caminho as teorias de conspiração baseadas na supremacia racial, o que nos fica no colo é uma obsessão irracional com o crescimento. O crescimento em geral. Dir-se-ia que todos os modelos que servem para fazer as contas e projectar o futuro só dão resultados positivos se continuarmos a crescer indefinidamente.

O meu senso comum diria que tendo como exemplo Portugal, com a sua população de 10 milhões, mais 500 000 menos 500 000, e não sendo um pais muito rico em recursos teria vantagem e não se esticar muito em termos de população.

Se o nosso ponto de equilíbrio população/recursos for, por exemplo, 7 milhões, pois que seja. Nascem menos uns bebés durante uns anos, porque a vida não anda fácil, e depois a coisa naturalmente equilibra, quando a fatia do bolo que calha a cada um for maior. Ou assim se desejaria.

Mas pelos vistos esta perspectiva ou não ocorre ou, se ocorre, não tranquiliza. Normalmente é apontada como principal fonte de preocupação a situação da segurança social. Mas eu diria que essa preocupação seria forçosamente temporária. Eventualmente, as pessoas morrem.

Por outro lado, num pais onde, segundo um número que ouvi algures, 400 000 portugueses vivem de rendimentos e que é um dos países da OCDE onde maior percentagem de valor do trabalho é apropriado pelo patronato, desenha-se de facto um cenário preocupante, mas para quem vive do trabalho dos outros. Haverá cada vez menos gente cujo trabalho explorar.

Outra perspectiva. Numa sociedade com uma classe dominante que captura uma grande parte dos recursos, o sucesso reprodutivo deve ser assegurado por aquela. Normalmente isso coincide com a prática de poligamia. Mas quem fica de fora não acha graça, como se pode ver com os exemplos do artigo do Psychology today.

Enfim, não sustento que estas visões sejam mais esclarecidas do que a predominante. Apenas acho que há mais factores em jogo nesta questão do que normalmente é discutido. E sobretudo questiono modelos que se baseiam em crescimento indefinido. Que eu tenha notado, o planeta não cresceu muito no último milhão de anos.

9 comentários:

CPrice disse...

.. que eu tenha notado também não. Que eu tenha notado não têm as sociedades de hoje como fazer face de forma exemplar e igualitária a todos quantos as constituem. Que eu tenha notado, há ainda (shame on us) crianças a morrer à fome, pessoas sem liberdades básicas asseguradas, populações em risco quer pela força dos homens quer por outras mais indomáveis com as da natureza. .. Comecemos por nos preocupar com quem está e depois preocupemo-nos com que há-de vir .. e acima de tudo paremos com os "alarmismos" que retiram a atenção do que é realmente alarmante .. (será pedir muito?)

(sorry for the testimony professor ;) .. brilhante abordagem, as usual.

L. Rodrigues disse...

Testemunho mais que bem vindo.
Agora essa coisa de me chamar professor... eu que nem a faculdade acabei :P ....

Anónimo disse...

Professor: aquele que ensina, mestre, aquele que é versado (onde eu li não diz licenciado) em qualquer ramo de ciência ou arte...
Posto isto, continuemos, até porque nem estou de acordo com o professor. Já cá faltava este, estarás porventura a pensar, l. rodrigues...
... Ou assim se desejaria... pois, quem nos garante que se fossemos 7 milhões a fatia do bolo que calharia a cada um era maior? Bem sei que o assunto é natalidade, mas será essa a verdadeira questão? Acho que não. Angola, por exemplo, é 14 vezes maior e tem infinitamente mais riquezes que Portugal, e só tem (creio eu) mais 1,2 vezes habitantes... Não me parece que o problema seja a natalidade... mas distribuição.

L. Rodrigues disse...

Ora bem Mike. 17 valores. Só não é mais porque não tenho a certeza absoluta de que a distribuição de que falas seja a mesma de que eu falo nas minhas entrelinhas.

CPrice disse...

.. mesmo com as letras retiradas do teclado pelo mr. mike .. ;) o meu "professor" professor não se prende com médias, cursos e percursos acabados ou por acabar .. e já agora: deve ser pronunciado com um ligeiro " british accent" if you please ;)

(quase de partida para férias, justifica-se assim o "silly"? .. hope so).

Vasco Pontes disse...

... por acaso, ou talvez não, o post corresponde a uma preocupação que ando a remoer desde há algum tempo.
completamente de acordo
abraço

Fábio disse...

Se a fecundidade por mulher for inferior a 2,05 a população tenderá a descer, não é? A população portuguesa não tenderia para um patamar de 7 milhões, tenderia, sim, para zero.

Vi umas previsões de pirâmides etárias em que o escalão mais populoso em Portugal em 2050 seria o dos "jovens" dos 70 aos 74 anos (e isso quer para os homens como para as mulheres). Imagino que uma sociedade com uma população tão envelhecida não deve estar preocupada com o progresso tecnológico ou com fontes alternativas de energia, mas sim com os custos da saúde pública, do financiamento de casas de repouso, pagamento das pensões de reforma, ou da solidão dos idosos.

L. Rodrigues disse...

Caro Fábio,
Antes de mais nada, bem vindo.
A estatistica que adianta até pode ser verdadeira mas sem contexto não me permite uma análise. Quer ela dizer que se agruparmos a população por intervalos de 5 anos, o segmento maior é o de 70 -74? È possivel. Quer isso dizer que é maior do que os outros todos "produtivos" juntos? Duvido. Não dou de barato que a acima dos 60 anos as pessoas só pensem na "velhice", mas de igual modo não desejaria que os mais novos não se preocupassem de todo com os mais velhos, se a proporção fosse diferente. De qualquer modo, o verdadeiro ponto do texto é que numa sociedade tão desigual como a portuguesa, não é com medidas avulso que se contraria a tendência da natalidade. Uma sociedade mais amiga das familias é forçosamente mais amiga de mais gente, nomeadamente aqueles que dependem exclusivamente do seu trabalho para viver. Viver, e não sobreviver, como parece ser a tendência.

Fábio disse...

As pirâmides em causa estão disponíveis aqui: http://www.census.gov/cgi-bin/ipc/idbpyrs.pl?cty=PO&out=s&ymax=250&submit=Submeter+consulta .

A promoção da natalidade não deve ser fácil. Um colega meu foi com a mulher e a filha ao oceanário e resolveu não visitar aquilo por ser muito caro. Entraram só elas. Se calhar a promoção da natalidade exige tornar todo o ambiente mais simpático para as famílias.