25 junho, 2006

E se a infelicidade pagasse imposto?

Há uma ideia, quanto a mim uma boa ideia, que tem despertado algum interesse em certos ciclos, especialmente aqueles que procuram encontrar uma alternativa à teoria económica dominante. Uma missão para a qual não estou qualificado, mas isso não me impede de fazer eco de quem está.
Um dos principais problemas da economia neo-clássica é assentar numa noção errada e cada vez mais ultrapassada da natureza humana. Nomeadamente que as pessoas são mais felizes quando têm mais coisas.

Alguns autores, que sabem que a história tem algo para ensinar, interrogaram-se sobre porque é que vivendo o Ocidente uma vida muito mais rica materialmente, não é nem um pouco mais feliz do que dantes.
Primeiro que tudo há que perceber o que é a felicidade. Não falamos aqui de algo idealizado e intangível, essa noção de felicidade tem feito provavelmente mais gente infeliz do que é bom admitir. Falamos de coisas relativamente simples e práticas. Todos temos uma noção de quão satisfeitos, realizados, tranquilos, entusiasmados, estamos com as nossas vidas. Se se perguntar a uma pessoa se é feliz, é muito provável que a resposta seja válida: sim, não, nem por isso, falta qualquer coisa, gosto da minha familia mas do meu trabalho nem por isso, etc, etc..

Isto pode parecer óbvio, mas durante uma boa parte do século 20, a psicologia behaviorista dominante negou-o, afirmando que é impossivel saber o que as pessoas pensam, apenas se pode observar o que fazem. Assim, por exemplo, quando uma pessoa entra numa espiral de consumo, a psicologia behaviorista conclui que essa pessoa consome porque isso lhe dá prazer, e como tal contribui para a sua felicidade. A psicologia moderna há uns anos que colocou isso em causa. Nomeadamente porque a teoria não era confirmada pelos factos (coisa que a teoria económica frequentemente ignora).

Assim, a felicidade hoje é medida quer num nivel geral, quer num nivel particular. A imagiologia cerebral permite identificar os acontecimentos que despertam o prazer ou o medo, a tranquilidade ou a angustia etc etc.
Fruto destes estudos sabe-se que as pessoas, por um lado, não são muito boas a prever o que lhes vai trazer felicidade. Por outro lado, sabe-se que as pessoas se habituam ao seu estado, e aquilo que parecia ser uma fonte de felicidade deixa de o ser passado uns tempos, e o mesmo se passa com algumas fontes de infelicidade.

Quando falamos de bens materias isto é especialmente óbvio. A felicidade das pessoas só aumenta com os bens materiais até um certo nível, um pouco acima da subsistência. Acima disso, incrementos de riqueza podem causar picos de felicidade, mas depois a pessoa reverte para um estado “normal”. Este estado é ditado sobretudo pela comparação com as pessoas à sua volta.

Por isso uma das coisas que importa identificar é que coisas causam felicidade, e nunca são demais. E entre essas estão coisas como boas e sólidas relações sociais, amigos, família, sexo, um trabalho compensador, que dá significado ao que fazemos, e outras assim.

A resposta é simples e parece senso-comum, mas a verdade é que a vida a que cada vez mais gente é obrigada, no esforço pela competitividade e na busca de uma ideia de felicidade vendida por quem não sabia do que falava, nos afasta cada vez mais das verdadeiras fontes de bem estar.

A desintegração das famílias, a trivialização das relações, a mobilidade imposta a trabalhadores e famílias, a angustia de ficar para trás numa corrida sem sentido, são-nos impostas como modernidade, flexibilidade, liberdade individual, sucesso. Por vezes o discurso parece até assustadoramente moralista. Mas se olharmos para o que se exige, é simplesmente mais tempo e estabilidade para nos relacionarmos uns com os outros de formas emocionalmente construtivas.

A ideia nova de que falei ao princípio, é a de integrar a felicidade numa nova teoria económica. A teoria vigente tem um nome para os custos que ficam fora do sistema: Externalidades. São externalidades, por exemplo, os custos ambientais de uma industria. Durante décadas foi permitido poluir à vontade fazendo com que todos pagassem esse custo, em benefício de alguns que lucravam com isso. Esse estado de coisas conduziu directamente à actual ameaça do aquecimento global, por exemplo.

Assim, a infelicidade devia ser considerada como uma externalidade e, reconhecida como tal numa politica de justiça, sujeita a impostos e multas.

Não julguem a ideia pelo simplismo da minha esplanação. O autor de onde trago uma boa parte destas ideias é um dos mais eminentes economistas britânicos da actualidade, e o seu livro Happiness é apenas uma primeira tentativa, talvez ainda imperfeita, de tentar perceber como um Estado se pode organizar para fazer aquilo que é afinal a sua razão de existir: promover a felicidade dos seus cidadãos.

Os opositores chamam paternalista a este tipo de propósitos. E insistem que a felicidade está ligada a coisas como "liberdade económica". O pior cego é mesmo o que não quer ver. Mas o assunto, como de costume não fica por aqui.

16 junho, 2006

Já tardava.

Antes que o designorado passe a desquecido vou aqui dar conta dos temas à volta dos quais tenho andado a matutar e sobre o quais espero vir a elaborar mais nos próximos posts.

Ando a ler um livro intitulado “Happiness” de um economista chamado Richard Layard. Nesse livro ele defende algumas ideias interessantes que o pensamento económico corrente tem ignorado. Nomeadamente questiona, com vasta fundamentação, a ideia central de que quanto mais riqueza temos mais felizes somos.
Parece a espaços um conjunto de ideias banais, de senso comum ou sabedoria popular, mas a verdade é que, na medida em que a ciência consegue medir a felicidade, demonstra-se que esse senso comum estava certo.
A tese do livro é que, sabendo o que faz de facto as pessoas felizes, é desejável desenhar outro tipo de politicas económicas, nomeadamente umas que distribuam a riqueza de forma a minorar um dos grandes focos de infelicidade, que é a desigualdade. Falo de desigualdade económica, como a que é fácil de encontrar em Portugal e mais difícil, por exemplo, nos países nórdicos.
Mais sobre isto num futuro post.

Sobre energia, dei-me conta de um facto curioso. Face à eminência do “peak oil” — o termo usado para designar o ponto máximo de produção de petróleo antes do declínio inevitável por esgotamento das reservas— cada vez se ouve falar mais de energia nuclear.
Mas o que pelos vistos pouca gente sabe, é que o “Peak Uranium” foi atingido há cerca de 20 anos. Uma larga percentagem da energia nuclear actual é produzida a partir de ogivas nucleares desactivadas pelos pactos de desarmamento. As centenas actuais de centrais nucleares de todo o mundo já têm um limite no horizonte para as suas funções. As milhares que seria preciso construir para substituir por completo o que tiramos do petróleo seriam elefantes brancos instantâneos.


Para terminar, há uma coisa que me faz confusão. A insistência em modelos centralizados de produção de energia, como aquela mega central solar de Serpa. É sempre louvável um investimento sério em energias renováveis, mas fica-me sempre a impressão de que o negocio da energia é sistematicamente mantido na área dos grandes projectos centralizados para assegurar que continua a ser um negocio atractivo para os grandes investidores.
Alguma centralidade tem que existir para assegurar a manutenção de reservas nacionais, mas penso que seria muito mais séria uma politica de disseminação da produção de energia, recorrendo a diversas fontes. Se por exemplo todos os telhados do pais tivessem 60m2 de painéis fotovoltaicos, estariam garantidas todas as necessidades de electricidade do pais. É um extremo desnecessário, e provavelmente com alguns contras mas dá uma ideia do que era possível fazer com outro enquadramento.
Para não falar do que seria possível fazer com melhores regras de construção... Na Alemanha, foi criado um standard chamado Passivhaus que certifica casas energeticamente eficientes. As casas construídas por estes standards não têm sistemas activos de aquecimento ou arrefecimento, e mantêm uma temperatura média de 21,4° C. Um cuidados isolamento e dimensionamento da exposição solar, permite que as fontes de calor naturais como o corpo das pessoas e o sol, em conjunto com o resultante de cozinhar ou aquecer água para banhos, seja suficiente para manter uma casa confortável, até no inverno da Alemanha.
Por cá, seria preciso transformar aquilo que é um cancro numa cura. Pouco menos que um milagre para mudar as cabeças de presidentes de câmara e os empreiteiros que os alimentam.

07 junho, 2006

Interlúdio Musical

Post concebido exclusivamente para ganhar tempo e proporcionar um bom momento a apreciadores de John Lee Hooker e Van Morrisson.

Ou ainda para os apreciadores de R.E.M. e um amigo deles.