As ideias que tendem a despertar mais, e mais vivas, respostas neste blogue parecem ser aquelas que sugerem (e fiz isso mais do que uma vez) que nas organizações politica e social devem haver mecanismos que regulem eficazmente a dinâmica da vida das pessoas de forma a que estas possam encontrar o maior bem estar pessoal possível.
Assim, quando sugiro que a felicidade devia embeber o propósito legislativo, não falta quem considere que tal coisa é do foro pessoal e como tal completamente fora do âmbito da responsabilidade de um Estado.
Da mesma forma, quando deixo subentendido que o excesso de endividamento se deve em parte a uma deficiente regulação da actividade bancária, não falta quem coloque a responsabilidade em quem contrai dividas que não pode pagar, indo contra o que parece o mais elementar bom senso.
Cabe aqui dizer que a pessoa - o agente racional egoísta - que serve de base a estes raciocínios é um mito. Começa por ser um mito porque ninguém possui a informação perfeita que leva a decisões perfeitas. E depois torna-se um mito ainda maior porque mesmo na posse da melhor informação possível, as escolhas não são necessariamente racionais, ou egoístas.
Somos máquinas de adquirir status, não de encontrar felicidade. Isto são coisas que a humanidade descobriu várias vezes ao longo dos milénios e foi inscrevendo em filosofias, religiões, adágios, máximas etc. Os apelos ao despojamento, ao encontro com os outros, à elevação do carácter, existem em quase todas as culturas.
Hoje, no século XXI, muita da psicologia e sociologia reconhecem e reforçam a verdade destas sabedorias. No entanto a politica e a sociedade durante uma boa parte do século XX continuam a ignorá-las preferindo usar como modelo para a humanidade “o agente racional egoísta” e a ideia de que se cada um fizer o que é melhor para si, acaba por ser melhor para todos.
Mas se as pessoas soubessem sempre o que é melhor para si, não compravam coisas a pensar que se vão sentir melhor por isso, não olhavam para o vizinho com inveja, davam mais atenção aos outros, procuravam ocupações que além de subsistência lhes davam significado e propósito…
Não é assim, e o que temos é uma corrida ao armamento, em que a única coisa que conta é ter cada vez mais não interessa porquê nem para quê, mas em que o preço é a nossa saúde mental, o ambiente, e a vida de todos os que são pobres “por culpa própria”. É por culpa deles que só vêem a pior televisão, que não lêem livros, que não imaginam outros projectos de vida, que não “arriscam”, que comem com a boca aberta, que não sabem uma língua estrangeira, que não procuram um emprego melhor, que são indiferentes a uma peça de Bach…
E quando as pessoas chegam a um ponto em que votam contra este estado de coisas, como na Venezuela, Bolívia ou Equador, de repente deixam de ser "agentes racionais". Para votar, já são uns tontinhos que se deixam enganar.
6 comentários:
.. :) indeed
" A teoria política de Rawls fundamenta-se na prioridade do justo sobre o bem.
Isto quer dizer duas coisas:
1) as liberdades individuais, embora prioritárias, devem ser complementares aos anseios por igualdade e
2) os princípios da justiça têm de ser independentes de qualquer concepção particular de "vida boa"."
E o mais interessante é que há experiencias que demonstram que há nas pessoas um impulso equalitário e por resultados justos em detrimento de "óptimos" ou "eficientes".
Mas isso complica imenso a teoria económica.
de facto .. ainda que diversas teorias não passem disso mesmo: sem qualquer praticabilidade :)
O problema é que há demasiada gente a colocá-las em prática, porque beneficiam quem pode controlar o dinheiro e a informação...
Lamentável para tantos outros que além de não o terem nem ganharem nada enquanto "cobaias" também não tem qualquer hipótese de acesso à dita "informação". Penso que propositadamente na maioria das vezes.
E com tanto argumento esqueci-me de o "parabenizar" por mais uma excelente peça.
Obrigado.
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