30 janeiro, 2006

Janelas de oportunidade

Aqui há uns tempos, fiquei a saber como se desenvolve a visão estereoscópica nos primatas, nós incluidos. É um exemplo da estreita colaboração entre genética e aprendizagem que faz de nós o que somos.

Durante os três primeiros meses de vida o bebé não foca, porque ainda não processa individualmente as imagens de um e outro olho. Nesse periodo, um grupo de neurónios separa-se funcionalmente em dois, metade para olho esquerdo, metade para o direito.
Se por acaso um dos olhos permanecer tapado durante esse período ficará funcionalmente cego, embora estruturalmente intacto. Mas os neurónios que estavam destinados a processar a visão desse lado irão encarregar-se também do outro olho, o que recebe informação.

Ocorreu-me uma interrogação inquietante. É provável que o mesmo tipo de mecanismo se aplique a outras funções e aptidões. Por exemplo, se uma pessoa não se apaixonar na adolescência, se não aprender a arriscar, a fazer tolices, a desproteger-se, será que não está a deixar passar a sua "janela" de aprendizagem? E arrisca-se assim a seguir pela vida desapaixonadamente cego?

Porque é que isto me ocorreu, é cá comigo.

4 comentários:

João Villalobos disse...

Este poste ou é para ser tomado á letra ou não é. Se não é (caminho que prefiro seguir) ele é entusiasmante no salto literário - a palavra certa - que estabelece entre o neurológico e o psicológico.
Se for para tomar à letra, aí o caso "pio mais fino" e, qual funâmbulo, equilibra-se precariamente numa corda que procura aproximar os dois territórios mencionados.
Em suma, o que literariamente é possível e aplaudo pela forma, considero impossível atingir pela outra via.
Explicando de forma mais sucinta: Para mim a resposta é não.

L. Rodrigues disse...

De facto, não era para tomar à letra. Mas a metáfora não é um mero exercício literário...

L. Rodrigues disse...

Ainda assim acho curiosa a tua relutãncia em aproximar o psicológico do neurológico. Se fosse do ortopédico...

redonda disse...

Pela minha experiência pessoal não há perigo.
Não me apaixonei na adolescência, mas isso não me impediu de arriscar, fazer tolices, desproteger-me, apaixonar-me perdidamente e ter sido muito feliz anos depois (gosto de pensar que não foi antes porque ainda não o conhecia e tinha de ser ele).