27 novembro, 2006

Dois por cento (parte II)

Como avancei no post anterior, fiquei a saber que há uma disciplina chamada Neuroeconomia, um ramo da Economia Comportamental. Estas disciplinas, de uma forma geral, tentam perceber o que as pessoas estão a pensar, e sentir, quando tomam parte em actos "económicos" sejam transacções comerciais, apostas, doações... etc.

No caso da Neuroeconomia tenta-se perceber o que se passa no cérebro nessas circunstâncias através de Imagiologia cerebral.
Uma das conclusões a que se chegou, foi que quando se estabelecem relações de interdependência e confiança entre parceiros económicos — por exemplo um indivíduo empresta dinheiro a outro para investir — o cérebro segrega uma substância chamada Ocitacina, que está associada às relações entre progenitores e crias, ou no caso humano também à ligação entre pares.

Ou seja, o mesmo mecanismo, ou pelo menos parte dele, que acciona e mantém ligações de longa duração, manifesta-se nas transacções económicas. Económico aqui é usado de forma abrangente, inclui trocas e partilhas de propriedade, alimento, abrigo etc. Esta ligação garante de alguma forma um princípio de reciprocidade. Em geral, as pessoas sentem-se obrigadas a retribuir, a recompensar e até a dar simplesmente, sem nenhuma outra recompensa que o bem que isso as faz sentir.

Maiores níveis da hormona, estão associados a maiores níveis de confiança no outro.

Acontece que 2% das pessoas testadas no Laboratório de Neuroeconomia do professor Paul J. Zak são puros não-cooperadores. Não manifestam a menor intenção de reciprocar, nem se preocupam com as consequências para os outros. No dito laboratório estes indivíduos foram intitulados “bastards” que traduzi livremente por filhos da puta (FDP), já que é isso que eles são. Para efeitos práticos, sociopatas.

Estes individuos manifestam deficiencias nos mecanismos de produção e regulação da Ocitacina.

2% é o suficiente para desestabilizar um sistema. Um agente bem intencionado, uma pessoa normal, depois de experimentar a interacção com um FDP, vai abordar de forma mais cautelosa a próxima interacção. Poderá inclusive optar por racionalmente ter uma atitude FDP, mesmo estando sujeito às penalidades emocionais que lhe estão associadas em pessoas normais. O que dá o efeito de os actos FDP serem mais generalizados que os indivíduos FDP.
É de novo o dilema do prisioneiro a funcionar.

Como lidar com estes 2% de FDP? Para começar podíamos deixar de os apontar como exemplo de sucesso e modelos para os nossos filhos.

Se isso não resultasse, podiam ser castrados. Mas era mais chato.

6 comentários:

marta r disse...

Mas esses "não-cooperadores" ou "bastards" ou "sociopatas" são assim porquê? A Neuroeconomia não explica?

L. Rodrigues disse...

Peço desculpa, o lapso foi meu por não o tornar evidente no texto.
Esses individuos possuem deficiencias na produção e regulação de ociticina. Provavelmente não a unica razão, mas um indicador importante.

marta r disse...

Ahhh. Então não são FDP, são doentes.

L. Rodrigues disse...

São. Mas não há nada de mal em chamar FDPice à doença.

São doentes como será um "serial killer" que tem descargas de dopamina quando mata as suas vítimas. Mas têm muito melhor reputação.

marta r disse...

É verdade. E os "serial killers" sempre dão alguns livros e filmes interessantes. Já os FDP são privisiveis e enfadonhos. Não saiem do mesmo registo.

Paulo Cunha Porto disse...

Meu Caro L.Rodrigues:
Explico por qu razão não fico apreensivo: a castração já foi dada como remédio para a calvície e as gentes continuaram a preferir unguentos mais do que duvidosos...
Abraço.