16 abril, 2007

Liberdades positivas

Aqui há uns meses, fruto da leitura de “Happiness-lessons from a new science” de Richard Layard, sugeri que a infelicidade poderia ser sujeita a imposto.

Colocado desta maneira, admito que poderia parecer como aquela anedota do dentista que era mais barato “sem dor” do que “com dor”. O paciente escolhia, claro, “sem dor” e, quando o dentista começava a arrancar o dente a sangue frio avisava: “Não grite, se não é mais caro!”
Ora, não era isso que se pretendia...

Volta o assunto á baila, porque o movimento entre economistas e outros cientistas sociais para promover outras medidas de desempenho das sociedades que não o PIB parece estar a tomar proporções suficientes para despertar reacções nos sectores que defendem que “crescimento acima de tudo, a mão invisível trata do resto”.

Os argumentos são os esperados. Que a felicidade é subjectiva, não deve ser um governo a determinar o que torna os seus cidadãos felizes, vem o papão dos marxistas e de outras engenharias sociais, etc. Ou então levantam argumentos morais: que a felicidade não é tudo, também há a beleza, a liberdade, e mais uns quantos...

Contrapondo ao motivo do lucro, na sua síntese, Karl Polany define os motivos humanos como: sobrevivência física, liberdade, e uma existência moral com significado.

Ultrapassado o problema da subsistência a importância do dinheiro dilui-se. Se uma pessoa não tem que se preocupar todos os dias se vai ter que comer, ou ter frio, o mundo fica muito mais cor-de-rosa de repente.

Emergem nessa altura outros factores. E são esses factores que a economia neo-clássica despreza.

Um indicador de progresso baseado em algo mais do que trocas comerciais, daria valor a coisas que o não têm no actual sistema, como por exemplo relações sociais ricas, coesão familiar, realização pessoal, tempo de lazer, a qualidade do ambiente. E alguém pode dizer que estas coisas não têm valor?

E um governo esclarecido não pode legislar de forma a favorecê-las? Pode. E deve. Sem beliscar a liberdade individual dos cidadãos. Pelo contrário, amplificando-a.

8 comentários:

CPrice disse...

completamente de acordo ..:)
e gostei de ler o comentário lá pelo cortes .. não é de facto esvaziando conteúdos ou contornos ..

L. Rodrigues disse...

Obrigado.
Esta mania de "matar a besta à fome" quando afinal a "besta" é afinal o repositório de poder dos que isoladamente têm pouco, também conhecidos por "povo", tem muito que se lhe diga...
É objectivamente retirar poder às pessoas e à democracia.

L. Rodrigues disse...

demasiados afinais, mas paciência...

CPrice disse...

:)

Ka_Ka disse...

Concordo plenamente...

Anónimo disse...

Os governos esclarecidos fazem isso nas sociedades perfeitas. Tenho dúvidas que as pessoas que fazem parte delas sejam mais felizes do que as que fazem parte das sociedades imperfeitas. Deixemos os governos, ditos esclarecidos, a legislar sobre tudo e logo haveremos de ver que as coisas descambam. Não me ponham o peixe no prato, ensinem-me a pescar.

L. Rodrigues disse...

Mike,
Se um tipo inteligente e até sensível como tu tem esse tipo de reacção não admira que isto vá na espiral em que vai.
Ensinar a pescar neste caso vem da psicologia, para uns, da sabedoria ancestral, ou até da religião para outros.
Mas é preciso haver um lago com peixe. Se é preciso tempo para as familias, não é de encorajar com leis urbanisticas que as pessoas vivam mais perto dos trabalhos?
Porque achas que em média os franceses são mais felizes do que os americanos? Porque ainda têm tempo para o que interessa. E achas que os governos não têm que ver com isto? Os modelos de sociedade?
Se as pessoas deixadas a si mesmas fizessem escolhas esclarecidas não havia mercado para os toques de telemóvel.

Anónimo disse...

Dou a mão à palmatória mas há um limite para tudo, até para legislar. Já reparaste que há pessoas que preferem viver longe dos trabalhos? Mas lá está, o meu lado liberal choca, nestas alturas, com o teu lado socializante. Mais uma vez, para que fique claro: dou a minha mão à palmatória (a esquerda).