09 abril, 2007

Mundo pequeno

É engraçado como as coisas são. Ainda este fim de semana no Público li um artigo sobre "home-schooling". Para quem não sabe, é a prática popular entre conservadores religiosos americanos de poupar os seus rebentos à exposição aos males do mundo, como gente que veste calças de ganga rasgadas ou a teoria da evolução.

Normalmente o "home-schooling" é defendido com base na liberdade dos pais de escolherem a educação que querem para para os filhos. Uma coisa que assim de repente até parece justa... se não se pensar muito nisso.

Engraçado dizia eu porque, no mesmo fim de semana, terminei a leitura de "Os autoritários". Entre outros factores, o aumento do homeschooling com o seu efeito isolacionista das ideias e da crítica, era apontado como promotor do aumento das tendências autoritárias e conservadoras (tacanhas, diria eu) no seio da sociedade americana.

Em nome da liberdade, alimentam-se ideias que conduzem potencialmente à opressão.

É um problema que sobressai da leitura da obra, de resto. Os não autoritários, pela sua natureza têm mais relutância em impor as suas ideias aos outros mesmo quando estes não hesitam em silenciá-las.
São obviamente mais tolerantes, e mesmo face a uma ameaça autoritária, tendem a procurar formas não agressivas de reacção, com discussão, debate, consensos. Tudo coisas que são vistas como fraquezas pelo outro lado.

É por isso que, por exemplo nos Estados Unidos, a direita conservadora é (ou era...) vista como organizada e forte, e os Democratas como fragmentados e com falta de liderança.

George W. Bush terá dito uma vez a seguinte "piada": Podemos enganar alguns, sempre. E é nesses que nos devemos concentrar".

Será possivel conciliar um discurso verdadeiramente tolerante, democrata e progressista com a veemência e agressividade necessárias para calar as ameaças autoritárias?

Ou estaremos condenados a ciclos de absolutismo-liberalismo, separados por revoluções mais ou menos violentas?

Não sei...


P.S. Só para avisar que o liberalismo ali não é económico, não haja confusões.

11 comentários:

CPrice disse...

ou: em sociedades de discurso verdadeiramente tolerante, democrata e progressista não haverá sequer lugar a ameaças autoritárias e portanto, torna-se dispensável a dita da agressividade para as combater .. (?) .. ok .. sonhadora eu .. eu sei.
:)

L. Rodrigues disse...

Os autoritários são 15% de nós. É relativamente fácil de perceber como 15% de pessoas motivadas, podem influenciar os destinos das restantes, que por defeito preferem uma abordagem mais suave aos conflitos.

CPrice disse...

e é ainda mais fácil perceber que "euzinha" ;) pertenço aos restantes 85%
Um bom dia por aí ..

Anónimo disse...

Posto dessa maneira, até parece que o homeschooling só existe na América e apenas entre os conservadores religiosos. Não é assim. É uma prática espalhada por quase todo o mundo, desde a autoritária China, à tolerante Europa ou ao liberal Canadá, e que abarca todo o tipo de famílias. Hoje, uma das razões principais para essa opção prende-se com a qualidade do ensino disponibilizado pelas escolas, considerado desactualizado e desadequado face aos desafios da Nova Economia, como agora se diz. A própria OCDE o reconhece. É um sistema passivo, não diferenciador, que não traz qualquer vantagem competitiva aos alunos nem promove o pensamento independente, dizem também. A falta de segurança e o consumo de drogas são mais duas razões apontadas pelos investigadores. Há estudos que dizem que os miúdos ensinados em casa têm um desempenho 30% superior aos que frequentam a escola, seja pública ou privada. Escolas virtuais, tutores online, ciber-comunidades, etc fazem parte da realidade do homeschooling, tal como os professores particulares e as cooperativas de ensino, o que não acontecia há 15 ou 20 anos atrás. O homeschooling, para miúdos e graúdos, é hoje uma tendência em crescimento, globalmente. Enfim, tirando a nazi Alemanha que o proibiu totalmente e retira as crianças às famílias que insistem em ensiná-las em casa. Falai de autoritarismos...

L. Rodrigues disse...

Tudo isso que disseste não contradiz, e em certa medida reforça, a diminuição do papel socializante do ensino através da escola, que é independente da sua qualidade e segurança.
E não é socializante de tornar as pessoas socialistas...

Ilustraste perfeitamente uma mentalidade em que é mais importante chegar á frente do outro do que conhecê-lo.

Anónimo disse...

Mais uma vez não estou de acordo. A maioria das crianças ensinadas em casa não difere das outras ensinadas na escola; pelo contrário, têm até mais hipóteses de se envolverem na vida da comunidade, integrando diversas actividades cívicas, culturais, religiosas ou de voluntariado aí existentes. Falo de coisas como tocar na banda dos bombeiros, servir o lanche aos idosos do lar, fazer ginástica ou jogar futebol ou hóquei no clube local, participar nas actividades da paróquia (catequese, equipas de jovens, escutismo, acólitos, etc...). Não me parece que seja uma filosofia de chegar à frente do outro. E depois, qualquer sítio serve para ter aulas: um museu, o zoológico, as ervilhas da sopa... Neste sentido, a escola até me parece mais redutora (onde está a diversidade de estudares 4 anos sempre com a mesma turma e o mesmo professor? Onde está a socialização na escola particular?).

L. Rodrigues disse...

Há socialização, no sentido em que ela é importante neste contexto, se nessa turma houverem pessoas fundamentalmente diferentes de mim.
(o que admito que não seja o caso em certos colégios particulares que acabam por funcionar no mesmo sentido de restringir o olhar sobre a sociedade...). O hommeschooling como forma de "proteger" é simplesmente encasular as crianças, não educá-las para uma sociedade plural.

Anónimo disse...

Lá venho eu outra vez, ganda chata ;)... Quero só fazer uma pequena distinção: o homeschooling em si não encasula as crianças, é apenas mais uma forma de ensino, embora diferente do mainstream e talvez por isso cause tanto medo (mas não é a única, há muitas outras, fora do modelo da escola tradicional); são as opções de vida dos pais ou dos tutores que podem levar a essa situação. Se mantiverem a criança sempre resguardada do contacto com o resto do mundo, obviamente que não há socialização, nem pluralidade, nem coisa nenhuma, de resto. Se optarem por uma vida normal, igual à do comum, com os seus momentos de isolamento e os de convivência, tanto com a família, como com os amigos, os conhecidos, os estranhos, e o que mais nos aparece no dia-a-dia, então o problema não se põe.

L. Rodrigues disse...

Se o mundo fosse todo feito de pessoas razoáveis, nem estávamos a ter esta conversa.

Anónimo disse...

Estamos a ter esta conversa porque tu começaste por fazer uma generalização demasiado simplista e radical sobre o tema, que não espelha a realidade actual. Não te chateio mais, ehehehe, beijinhos e bom fim de semana

Anónimo disse...

É interessante que Jesus Crist foi educado em casa pelos pais, mais pela mãe,