14 maio, 2006

Bê à Bá.

Na sexta-feira assisti a uma entrevista com o jurista, economista e ex-ministro das finanças, Henrique Medina Carreira. Este, para quem são saiba, é um homem que diz o que nenhum político diz: que anda tudo a brincar, e que os portugueses é que vão sofrer daqui a 10 anos.

Para contrariar esse estado de coisas, uma das apostas dos governos é a educação e qualificação. Ou assim dizem. E vem sempre à baila o exemplo da Finlandia, ou da Irlanda. Sobre a Irlanda sei menos, mas sobre a Finlandia encontrei uns artigos interessantes.

Para a nossa educação ser comparável à daquele país, começamos por ter no mínimo uns 50-70 anos de desvantagem. Ou mais. Em 1921, os finlandeses reformaram o sisema de ensino de acordo com o modelo suíço (uma coisa que também nunca percebi: porque é que não nos limitamos a imitar o que os outros fazem bem, mesmo com ligeiras adaptações?). Este modelo implicava 9 anos de escolaridade obrigatória, a responsabilidade municipal de manter uma escola onde houver pelo menos 30 crianças, e também o cuidado de que nenhuma delas fique a mais de 5 km da respectiva escola.

Depois, terminados os 9 anos obrigatórios, coloca-se a escolha de uma escola vocacional ou da preparação para a Universidade. 94% escolhe ou uma ou outra.

Estas escola são heterogéneas. Podem ser liceus mais ou menos normais, mas também podem estar vocacionadas para determinadas áreas, como a mantida pela Nokia com enfase na matemática e tecnologia, ou outra escola que prepara os melhores atletas de hóquei no gelo, patrocinada por uma fábrica de equipamento.

Os finlandeses beneficiam de algumas caracteristicas próprias e irreproduzíveis: a lingua é especialmente fácil de aprender a ler e escrever. Há uma enorme valorização da leitura, atribuida aos longos invernos que estimularam durante muito tempo hábitos de leitura, e mesmo a televisão e o cinema (aqui à nossa semelhança) são exibidos com legendas e não dobrados. No 3º ano de escolaridade começam a aprender uma segunda língua, e no 5º uma terceira.

Mas um dos factores mais importantes para o sucesso será talvez a inteira dedicação dos professores ao ensino. Todas restantes tarefas das escolas são atribuidas a pessoal auxiliar e administrativo, e até as turmas com mais de 18-20 alunos, são assistidas por um auxiliar, que ajuda o professor. Além disso, as crianças com dificuldades de aprendizagem são acompanhadas ao nivel da escola, mobilizando-se esta para providenciar aulas suplementares, explicações ou outras acções que permitam o aluno manter a sua presença na sala de aula e acompanhar os programas com os seus colegas.

Como é que podemos ser como a Finlandia? Não faço ideia. A receita parece ser a que qualquer pedagogo sensato receitaria: professores dedicados, escolas e turmas dimensionadas. Porque é que é tão difícil?

O pior de tudo é o efeito cumulativo de uma geração de professores incompetentes e/ou desmotivados, eles já fruto de um sistema que nunca teve uma estratégia, critérios cientificos, e objectivos que servissem as necessidades do país e das pessoas.

7 comentários:

A disse...

Conheço uma escola exactamente assim,neste nosso país, tirando apenas o pormenor da língua evidentemente e tambem a opção profissionalizante no 9º ano de escolariedade obrigatória... A péssima notícia é que, neste país que é o nosso, isto custa no mínimo( sem actividades extra-curriculares e sem refeições) 500 Euros. Para lá "entrarem" as crianças, os pais são entrevistados, as crianças são avaliadas e entrevistadas posteriormente sem os pais, num ambiente ludico, e as vagas por anos nunca ascendem a mais de 80, sendo que esta escola privada tem cerca de 2000 alunos do 1º ao 12º ano.
Estamos bonitos, não estamos?

L. Rodrigues disse...

Pois estamos. O que é infeliz é que não custava mais isso por aluno, para fazer as escolas publicas funcionarem mais assim. È só uma questão de organização e vontade. O que já gastamos com educação se fosse bem gasto, bastava. Suapeito eu.

Paulo Cunha Porto disse...

E não podemos esquecer, Caríssimo L.Rodrigues, a reformulação geral dos programas, quer no sentido de os tornar mais maleáveis, tal o exemplo finlandês, como, sobretudo, mais atractivos. Porque sem despertar o interesse, por muito que se melhorem as infra-estruturas e o corpo docente, não vamos lá.
Abraço.

João Villalobos disse...

Na primeira linha escreveste «entervista». Bem precisas de ir para a Finlândia ;)
Abraço

L. Rodrigues disse...

Neste caso receio que não seja uma questão do sistema educativo mas antes do sistema de saúde... Além disso, tens a certeza que leste bem? ;)

Anónimo disse...

Em 1996 visitei, durante uma viagem nostálgica e inesquecível, um país Africano situado na costa ocidental desse Continente e com alguma influência portuguesa. O Quénia. E não pude deixar de observar e posteriormente refletir sobre algo que vi com frequência de norte a sul e nos mais recôndidos locais. Falo-vos de algumas escolas primárias, que é por onde tudo deve começar. Sabem o que vi? Muitos alunos e todos disciplinados e interessados no que os professores diziam, apesar de estarem descalços. professores dedicados aos seus alunos. Escolas sem tectos, sem paredes e sem ardósias. Aulas de matemática dadas om uma vara e cujos os exercícios eram passados e explicados no chão, na poeira. Isto diz-vos alguma coisa? Alguém me dizia há dias: "há mais lixo que apanhadores de lixo, mas isso não justifica que se baixem os braços e se atire lixo para o chão". Voltando ao Quénia: provavelmente estive em presença de um país e de uma mentalidade em que o colonizador foi o Reino Unido. Como sempre e moral da história: temos todos a culpa. Todos nós. Menos os alunos.

L. Rodrigues disse...

Tudo o que os alunos precisam é de uma razão para aprender, não?