Quem, como eu, não se esquiva a espreitar de vez em quando a imprensa económica, e os seus comentadores, cruza-se frequentemente com o tema recorrente da Europa envelhecida e esclerosada, presa a modelos sociais falidos e destinada a soçobrar face aos magníficos desafios da globalização, se não se reformar.
A palavra chave é "reforma". Vamos esquecer por momentos o caso português. Não pretendo por um momento que o nosso Estado não precisa de uma reforma. Embora questione que seja a que lhe querem fazer. Mas isso fica para outras núpcias.
Normalmente o que se faz é comparar a Europa com os Estados Unidos, dizer que estes estão melhor porque têm uma política económica e social mais "livre" e que a Europa se afunda se não se reformar. A ladaínha dos últimos anos na referida imprensa.
Quando se tenta afinal tentar perceber quão mal está a Europa, é preciso ir ver os números. Por exemplo, a criação de emprego. Constata-se que a criação de emprego na Europa está a ficar a par com os Estados Unidos. Ou seja, dir-se-á que não é por haver um estado social e algumas medidas sensatas de protecção do emprego que os empregadores não aparecem.
O PIB Europeu deverá aumentar 2,7% este ano, em grande parte fruto de um aumento de exportações. A procura interna também dá sinais de alguma recuperação, mas ainda ligeira.
Os ganhos de produtividade na Europa nos últimos anos estiveram a par dos EUA, ao contrário do que foi sendo voz corrente.
E, depois de um período de crescimento bastante moderado. tudo indica que a Europa começa a dar sinais de aceleração, mantendo a vitalidade da economia Global numa altura em que os EUA começam a claudicar.
Mas o mais significativo é que a Europa faz isto sem contrair uma dívida de centenas de triliões de dólares como os EUA, sem as mesmas desigualdades gritantes dos EUA, e com melhor saúde pública e protecção do emprego.
Face a isto interessa perguntar de onde vem essa pressão para abandonar o modelo social europeu. Se não é um obstáculo ao desenvolvimento, se promove bem estar e vitalidade económica, porquê esta obsessão pela reforma?
Como foi notado por alguém:
"The only difference is that Europe's wealthy are not making out as amazingly well as America's. And that's also the ONLY reason "reform" (lower wages, more flexibility, fewer rights for workers) is being pushed on us on a systematic basis. The only one.(...)"
Jerome a Paris
10 dezembro, 2006
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
3 comentários:
Parece-me que essa obsessão pela reforma é, não diria óbvia, mas típica de um continente a que nos habituámos a designar como velho. Senão vejamos: eu, perto dos 50 anos, com muitos encargos, com um orçamento familiar pesado, aliado a uma concorrência laboral feroz de jovens cada vez mais bem preparados, estou mais obsecado com a reforma que tu, que chegaste recentemente aos 40. Também é natural que o Velho Continente questione cada vez mais tudo o que faz. Acredita que só assim, mesmo que não se alterem muitos dos privilégios adquiridos, o Velho Continente se mantém jovem e actual. E a Europa sabe disso.
O velho continente questiona e deve sempre fazê-lo. Deitar fora simplesmente o Estado social por ser velho e pensar em mais coisas do que no lucro imediato de alguns, é mais ou menos o mesmo que seres afastado só porque te aproximas dos 50, mesmo que continues a assegurar mais facturação do que todos os jovens juntos.
Tens talvez a diferença de pensar nos resultados do próximo ano e não apenas no próximo trimestre?
A Europa ainda vai tendo uma visryde como essa.
Mas ainda assim há aquela tendência, que felizmente muitas das vezes não passa de tendência, em olhar para o gajo de 50 e ver o passado e olhar para os jovens e ver o futuro. O mesmo se passa com o Velho Continente e com os continentes emergentes. É aquele velho (cá está) chavão "ali é que está o futuro". É incontornável e por vezes, por mais seguro que o Velho Continente esteja, vacila perante tantas vozes que só o identificam com história secular.
Enviar um comentário