16 junho, 2006

Já tardava.

Antes que o designorado passe a desquecido vou aqui dar conta dos temas à volta dos quais tenho andado a matutar e sobre o quais espero vir a elaborar mais nos próximos posts.

Ando a ler um livro intitulado “Happiness” de um economista chamado Richard Layard. Nesse livro ele defende algumas ideias interessantes que o pensamento económico corrente tem ignorado. Nomeadamente questiona, com vasta fundamentação, a ideia central de que quanto mais riqueza temos mais felizes somos.
Parece a espaços um conjunto de ideias banais, de senso comum ou sabedoria popular, mas a verdade é que, na medida em que a ciência consegue medir a felicidade, demonstra-se que esse senso comum estava certo.
A tese do livro é que, sabendo o que faz de facto as pessoas felizes, é desejável desenhar outro tipo de politicas económicas, nomeadamente umas que distribuam a riqueza de forma a minorar um dos grandes focos de infelicidade, que é a desigualdade. Falo de desigualdade económica, como a que é fácil de encontrar em Portugal e mais difícil, por exemplo, nos países nórdicos.
Mais sobre isto num futuro post.

Sobre energia, dei-me conta de um facto curioso. Face à eminência do “peak oil” — o termo usado para designar o ponto máximo de produção de petróleo antes do declínio inevitável por esgotamento das reservas— cada vez se ouve falar mais de energia nuclear.
Mas o que pelos vistos pouca gente sabe, é que o “Peak Uranium” foi atingido há cerca de 20 anos. Uma larga percentagem da energia nuclear actual é produzida a partir de ogivas nucleares desactivadas pelos pactos de desarmamento. As centenas actuais de centrais nucleares de todo o mundo já têm um limite no horizonte para as suas funções. As milhares que seria preciso construir para substituir por completo o que tiramos do petróleo seriam elefantes brancos instantâneos.


Para terminar, há uma coisa que me faz confusão. A insistência em modelos centralizados de produção de energia, como aquela mega central solar de Serpa. É sempre louvável um investimento sério em energias renováveis, mas fica-me sempre a impressão de que o negocio da energia é sistematicamente mantido na área dos grandes projectos centralizados para assegurar que continua a ser um negocio atractivo para os grandes investidores.
Alguma centralidade tem que existir para assegurar a manutenção de reservas nacionais, mas penso que seria muito mais séria uma politica de disseminação da produção de energia, recorrendo a diversas fontes. Se por exemplo todos os telhados do pais tivessem 60m2 de painéis fotovoltaicos, estariam garantidas todas as necessidades de electricidade do pais. É um extremo desnecessário, e provavelmente com alguns contras mas dá uma ideia do que era possível fazer com outro enquadramento.
Para não falar do que seria possível fazer com melhores regras de construção... Na Alemanha, foi criado um standard chamado Passivhaus que certifica casas energeticamente eficientes. As casas construídas por estes standards não têm sistemas activos de aquecimento ou arrefecimento, e mantêm uma temperatura média de 21,4° C. Um cuidados isolamento e dimensionamento da exposição solar, permite que as fontes de calor naturais como o corpo das pessoas e o sol, em conjunto com o resultante de cozinhar ou aquecer água para banhos, seja suficiente para manter uma casa confortável, até no inverno da Alemanha.
Por cá, seria preciso transformar aquilo que é um cancro numa cura. Pouco menos que um milagre para mudar as cabeças de presidentes de câmara e os empreiteiros que os alimentam.

7 comentários:

A disse...

Chiça que o interlúdio já enjoava: Van Morrisson/John Lee Hoocker e R.E.M. mandaram-me uma carta para que os esclarecesse de como interpôrem uma providência cautelar ao post de um tal de designorado e links a eles próprios...Mas a coisa resolveu-se com bom senso, e entre esta gente evoluída surgiram mensagens telepáticas ,cruzadas, e zás, surgiu acordo, vulgo novo excelente post. Ufa...
Jinho

Anónimo disse...

Caro Luís,

O artigo é brilhante! Mas vou deter-me no último parágrafo por ter sido o que, manifestamente, me despertou para a prosa. Como não acredito em milagres e há coisas que começam a tornar-se endémicas, como é o caso dos presidentes de câmara e dos empreiteiros que os alimentam, tenho uma visão radical para a solução: gerir o país como se de uma empresa moderna se tratasse. Aqui vai: o que tem que ser mesmo português são: o hino, a bandeira, o presidente e um grupo de notáveis; vamos chamar-lhe "Conselho de Administração Nacional". A partir daí, a começar no Primeiro Ministro e a acabar nos ditos presidentes de camara, passando pelos ministros, secretários de estado e gestores públicos, deveria haver a liberdade de contratar onde estivesse a competência, mesmo que fossem estrangeiros. "Que loucura, que insanidade", dir-me-às tu. É, até as pessoas sentirem que o ministro da agricultura norueguês que tinha sido contratado era melhor que o português, comprometido, não com o povo e com o país, mas com os seus interesses partidários. Valia a apena tentar o exercício. Tenho a certeza que haveria muitas (e boas) surpresas. As cabeças dos presidentes de câmara mudavam e os empreiteiros iam alimentar os cachorros de raça que têm nas suas herdades.

L. Rodrigues disse...

Caro Mike

Como uma empresa moderna talvez, como uma empresa pós-moderna como as que conhecemos hoje... onde os trabalhadores são tratados como sabes... e os administradores se enchem sem qualquer consideração moral oou social, não muito obrigado.
Henry Ford, sim. O neto dele, não.

Anónimo disse...

Muito bem. Estamos de acordo. Venha de lá um Henry Ford (não o neto) para ser ministro da indústria, em vez de um Zé Manel qualquer. É que ao contrário dos nossos políticos, que a custo são mudados de 4 em 4 anos (alguns deles competentes, porque os incompetentes parece que foram rebitados ao poder), esses senhores seriam assalariados do povo português, com objectivos para cumprir e que se não fossem cumpridos dentro de um prazo previamente estabelecido, conheceriam o sabor do desemprego... nos países deles.

Anónimo disse...

Estamos feitos, diria eu. As fósseis são 80% dos gastos mundiais. Como vamos inverter isto a tempo? Além do mais, ainda temos umas décadas após o peak oil e mais umas quantas até atingirmos o do gás, o que nos vai dando uma (falsa) sensação de segurança. Por outro lado, as renováveis não poluem, mas continuam a ser muito caras e também trazem impactos significativos, sobretudo se produzirmos em larga escala (para igualar a produção de uma central eléctrica média são necessários cerca de 1000 geradores eólicos ou 5 km2 de painéis fotovoltaicos, com todas as desvantagens que parques desses trarão à natureza, à saúde pública e mesmo às reservas de certas matérias-primas necessárias ao seu funcionamento). Todos falam no equilíbrio na exploração das diversas fontes e em aumentar a eficiência energética, mas poucos falam do mais importante que é reduzir este gasto absurdo de energia. Enquanto essa questão não for colocada a sério, não há solução à vista.

Vasco Pontes disse...

Caro L. Rodrigues,
Tardou, mas puzeste a conversa em dia. Temas todos interessantes, mas o que mais me motiva é o primeiro, o da relação entre riqueza e felicidade social, ou equilíbrio social, como prefiro chamar-lhe. Sinceramente não tenho ideias muito definidas ainda (aceitam-se contribuições :), mas algo terá que ser feito, porque decerto o caminho por onde vamos não nos dá grande futuro.
Abraço

Anónimo disse...

Caro Luis
Na questão abordada quanto á contratação de dirigentes escolhidos pela competencia , parece que ontem tivemos um bom exemplo com o Filipão.
A ideia mais interessante deste post é a da energia e das casas ou edificios autosuficientes (nalguns sitios chamada "construção sustentável") Isto já é muito possivel, como o demonstra o exemplo alemão, mas 2 obstáculos tivemos de fundo: 1-a facilidade com que se enriqueceu a construir porcarias , sem ter de ligar a isto 2-Uma EDP monopolista engordada tambem com os tremendos deperdicios de todos e longe da "empresa de serviço publico" que foi ( ou tentou ser , nalguns episódios de sua historia) e aqui (ainda mais triste do que na PT) nem sequer existe uma "EDP-Inovação" para ajudar a remediar.